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Uma coisa é a teoria, outra…

23 de janeiro, 2017 - por Max Franco

“Há muito-muito tempo, os Ratos se reuniram em assembléia para decidirem em conjunto o que fazer em relação ao seu inimigo comum: o Gato.
Na verdade, este Gato não era um inimigo qualquer, mas um felino de natureza das mais vorazes, que estava fazendo uma verdadeira devassa entre a população dos ratos habitantes daquela casa.
Depois de muito conversarem, um jovem rato levantou-se e apresentou a sua proposta:
– Estamos todos de acordo: o perigo esta na forma silenciosa com a qual o inimigo se aproxima de nós. Se conseguíssemos escutá-lo, podíamos, certamente, escapar facilmente. Por isso, proponho que lhe coloquemos um guizo no pescoço.
A assembléia recebeu estas palavras com entusiasmo. Foi então que um rato mais idoso se ergueu com dificuldades e perguntou:
– E quem é que vai por o guizo no pescoço do Gato???
Os ratos começaram a olhar uns para os outros, e não houve nenhum que se oferecesse para levar a cabo semelhante tarefa.
Então o velho rato terminou dizendo:

– Propor uma solução é fácil… Difícil é pô-la em prática.

Esta foi mais uma boa história proposta pelo nosso Líder de Equipe na sua última reunião mensal. A reação, porém, foi a mais inesperada:
– O que você quis dizer com esta história, André? – perguntou Joana com cara de poucos amigos.
– A história fala por si. Ela já diz tudo. – respondeu André sorrindo todos dentes.
– Ora, André, não nos subestime, por favor. – interrompeu Leandro. – Você sempre quer dizer alguma coisa com essas suas parábolas.
– Na verdade, não é uma parábola, mas uma fábula. De Esopo. – disse André.
– Não entendi. – afirmou Leandro.
– Há três tipos de contos com o que chamamos “lição de moral”. As parábolas geralmente tem humanos como personagens.
– Jesus gostava de usar parábolas. – reiterou Giovanni.
– Não diga! – comentou Armando.
– Apólogos são contos onde os personagens são objetos. Machado de Assis costumou criar bons apólogos. Já as fábulas…
– Animais falam. – completou Giovanni.
– É um gênio! – comentou mais uma vez Armando. – Você sempre arrasa, garoto!
– Mas o que quero saber é da “lição de moral”. – insistiu Joana. – Para quem se destinou a ferroada, André?
– Meus caros, este é o papel do storytelling: usar uma história com uma função específica. Muitas vezes é para ensinar, outras para educar, mas também é muito indicada para inquietar, desinstalar, incomodar…
– Pois você conseguiu, pois eu fiquei muito incomodada. Você acha que nós nos esquivamos dos desafios? Que fugimos da raia? Que não metemos a cara? É o que você acha?
– Não acho nada disso! Acho apenas que podemos discutir o assunto.
– Eu acho esta equipe muito responsável e comprometida. Considero que todos deste grupo se voluntariam a colocar o guizo no gato. – falou Leandro.
– Voltemos à história: quem deu a ideia do guizo foi o Rato jovem. – disse Giovanni. – E toda ideia é uma responsabilidade. Ele que devia ter se disposto a lidar com o Gato.
– Pois eu acho que um rato experiente é que deveria ir. – falou Joana olhando para Armando.
– Por que está olhando para mim? Tenho cara de rato? – inquiriu Armando. – Ou de velho?
– Já eu acho que a questão aqui é outra. E talvez a mais complicada, porque não vem à tona. Fica escondida como uma doença silenciosa. Uma diabetes, por exemplo. É a falta de ideias. – soltou Giovanni. – Ninguém dá ideias e ninguém precisa assumir as respectivas responsabilidades.
De repente, todos se calaram depois da punhalada do rapaz. Todos ficaram se olhando e reconhecendo a flagrante verdade no rosto de cada um.
– Alguém tem outra história? – indagou Joana.