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Entrevista Conexão Literatura

24 de janeiro, 2020 - por Max Franco

Entrevista concedida ao Sérgio Simka para a Revista Conexão Literatura
Fale-nos sobre você (uma minibio).
Um desajuste desde cedo.
Acredito fielmente que toda gente tem lá suas virtudes. Eu tive as minhas e as minhas se resumiam ao fato de, desde antes do tempo no qual todo mundo aprende a ler, eu já havia aprendido. Isso mesmo: sei lá por qual motivo dei de ler precocemente, antes da alfabetização já me tinha alfabetizado e vivia a demandar revistas em quadrinhos do pai que vinha do trabalho. O velho trocava as revistas nas bancas daquela época e pagava umas moedas pela troca. Às vezes, trazia de novo as revistas de antes, mas não tinha problema porque as relia da mesma forma sem reclamar. E, além de ler, eu jogava bola (menos bem do que lia). Eu queria ser uma espécie de Roberto Dinamite misturado com Conan Doyle. Lógico que funcionou nadinha.
Adolesci e li mais ainda. Depois, na juventude, optei por Letras na faculdade. A primeira profissão foi a de professor de Língua Portuguesa, literatura e redação. Depois de anos, fiz tanta coisa e trabalhei com tanta coisa, mas a literatura foi a amante mais antiga e, decerto, aquela que levarei até o túmulo.
Fale-nos sobre seus livros. o que o motivou a escrevê-los? (de maneira geral, ok?)
Escrevi porque li e de tanto ler, encheu tanto o copo que encharcou, desaguou pelas bordas. Escrevi porque tinha algo para dizer e disse escrevendo. Escrevi por necessidade e por amor às palavras. Para poder destilar sentimentos em forma de palavras. Para poder ter palavras para tocar e tocar as palavras que amo. Escrevi para entender o que sentia e por não compreender o que sentia, apresentei essas emoções na única forma que saberia. Escrevi por incompetência de entendimento. Porque nunca fui realmente muito bom em entender a Vida e, por isso, escrevi algumas pistas, um GPS que me guiasse sei lá para onde, talvez para dentro de mim.
Escrevi as emoções e, principalmente, as decepções. Escrevi as dúvidas, certezas quase nenhuma. Escrevi os sonhos, mesmo os irrealizáveis. Escrevi os delírios, os suspiros, os desejos, os medos e as quimeras. Escrevi porque sempre quis escrever e as coisas mais lindas que já vi – depois dos meus filhos – foram os meus livros. São todos muito bons porque são meus. Não preciso – ainda bem – que ninguém mais o reconheça. São minhas palavras escritas e são todas lindas, até as mais bizarras e desconexas. Lindas e mais lindas.
Como analisa a questão da leitura no país?
A leitura morreu e falta só ser enterrada.
Ninguém lê mais nada e o pouco que é lido não o merecia.
A Literatura está morta. A Grande Literatura, uma defunta. As pessoas agora só leem textos frugais, conteúdos de redes sociais e  livros de autoajuda, os quais não justificam nem sequer uma arvorezinha da floresta para serem feitos. É um mundo medíocre que rapidamente, em velocidade internética, vai se tornando cada vez mais obtuso e ignorante.As redes sociais fuzilaram a leitura e, depois, vieram os canais de streaming e enforcaram a moribunda. O escritor escreve porque não sabe fazer outra coisa. É um desesperado no seu último grito de protesto.
O que tem lido ultimamente?
Há alguns autores novos que são excelentes e há os velhos que nunca devem ser abandonados.
Dos “novos”, merecem atenção Albert Sanchez Pinol, Carlos Ruiz Zafon, Idelfonso Falcones, Isabel Allende, Ian Mcewan, Iuval Hahari e o melhor escritor brasileiro da atualidade: Cristovão Tezza.
Dos velhos, o cânone, os obrigatórios: Saramago, Dostoievsky, Cervantes, Maquiavel, Veríssimo, Machado e Lispector.
Que dica pode fornecer a quem deseja ser um escritor?
Desista.
Desista.
Se não seguir a dica 1 nem a 2, se não conseguir, sugiro autopublicação. Gaste seu dinheiro, reúna a família e os amigos, atenue um pouco da conta do que gastou nos livros, ofereça umas comidinhas, umas bebidinhas, faça fotos, poste essas fotos nas redes sociais e depois desista de vez.
Quais são os seus próximos projetos?
Nada é mais cruel e saboroso de se escrever do que um romance. Escrevi 3 e foi terrivelmente idílico fazê-lo. O romance é um trabalho físico. É maratona, enquanto o conto é corrida de cem metros. Já a crônica é caminhada na lagoa. O poema? Poema é passeio no parque, desde que não seja um poema sofrido. Poemas sofridos são passeio no parque, mas passeio descalço e sobre espinhos.
Meu próximo projeto será um romance que não fará dieta. Por isso estou adiando. Por preguiça.