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Confiança desconfiada

17 de novembro, 2016 - por Max Franco

Ela se sentou à mesa do lado. Não possuía nada de especial. Não era magra demais ou gorda, nem bonita nem feia. Não tinha nada digno de nota ou, por exemplo, algum elemento estético que demonstrasse descendência de vikings ou visigodos. Não parecia vândala ou bárbara. Não parecia, até que manipulou o pão que lhe fora servido e o comeu inteiro fazendo uso de garfo e faca. Quem é que come sanduíche com talheres? Eles justamente não nasceram para dispensar talheres? Como confiar numa pessoa que come pão com garfo e faca?!
Este fato me fez relembrar de todos os naipes bizarros de pessoas as quais me despertam profunda desconfiança. Pessoas, como sabemos, já não são de se confiar. Algumas, menos ainda.
Não confio, por exemplo, em quem não bebe alcoólicos. Gente que abre mão de cerveja gelada em dia quente (frio, morno, temperado…) deve ser estudado pela psiquiatria. Não confio, também, em quem não toma café e suas variedades. Não confio em quem não gosta de futebol, sexo, cinema e dia de chuva. Não confio, especialmente, em vegetarianos, veganos e em qualquer tipo de descarnizado. Não confio, com força e dedicadamente, em quem entope seu carro de caixas de som para espalhar o seu mau gosto aos 4 ventos. Sabemos que ninguém escuta Beethoven no último volume. Não confio religiosamente em religiosos, vendedores de carros, políticos de quaisquer legenda, previsões de tempo e economia, e, é claro, não confio em quem não gosta de bicho. Também acho que não confio em bicho.
Também tenho dificuldades em confiar em quem acorda cedo e feliz.Este tem tudo para ser psicopata. Na verdade, alegrinhos me fornecem um medo crônico. Como ser feliz (demasiado e ininterrupto) em 2016?! Onde mora essa pessoa, na Noruega? Não tem TV?
Não confio em muita gente, principalmente, nos vivos. Gente morta é mais fácil de confiar. Como se sabe, não há traições em cemitérios.
Em mim, confio, não confio, desconfio, por fim confio confidencialmente. Já me traí algumas vezes, mas não me
escondo mais de mim mesmo. Confio que confiar em mim me faz mais confiável. E confiante.