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O que sei aos 54

04 de março, 2024 - por Max Franco

O que um sujeito de 54 anos sabe da Vida?

Não sei. Mas sei que envelhecer me parece um despropósito e morrer, um desatino. Para que diabos tanta correria, tanta busca, tanta agonia, tantos saberes e sabores, tantos dissabores e dessaberes, se no fim há apenas o inexorável fim?

Já me parece um absurdo os tais 54! Quando, afinal, abandonei os 20 e poucos? Não foi num dia desses que desci do ônibus, corri para casa, tirei os jeans surrados e fui jogar bola na rua de areia batida com os outros pivetes?

-Sinto-lhe dizer que não foi. Faz 40 anos.

E nada “faz 40 anos” senão para velhos ou quase-velhos. Em suma, se você diz “faz 40 anos” para qualquer coisa, você está na descida da montanha.

Qual montanha?

A do mito de Sísifo, alguém diria.

Mas Sísifo não explica nada, eu diria se alguém dissesse “a do mito de Sísifo”.

Para quem não sabe, Sísifo contrariou os deuses gregos (e os deuses gregos parecem muito com o deus judaico-cristão do Velho Testamento: eles não são de perdoar!). Sisífo, então, recebeu uma punição exemplar: rolar diariamente uma pedra até o topo de uma alta montanha. Ao chegar ao cume, a pedra rolava para baixo mais uma vez e, no outro dia, ele deveria começar tudo novamente e assim para todo o sempre. Eis a Maldição de Sísifo: a mesma de todos nós.

-Que sentido tem isso? Que sentido, afinal, tem qualquer coisa se – no fim – no tal “The end”, eu, tu, ele, nós, vós, eles, todo mundo morre e se acaba?

-Ah, mas tem a Vida após morte… Ok. Ok. Não vamos discutir aqui nem religião nem hipóteses. Conjecturas podem consolar alguém, mas o fato é sempre um fato, e o fato é que morremos. Eu, você e aqueles que amamos, suportamos ou odiamos, todos viraremos saudades e lembranças, ou alívios e livramentos, depois nem isso. O postmortem, portanto, é apenas uma supeita consoladora, mas presunçosa.

O que fazer então? Como dizia o filósofo: dançar enquanto caímos nesse profundo abismo chamado Vida.

E, de alguma forma, tentar evoluir um pouquinho a cada dia, emprestando algum sentido à Vida, que não tem algum.

Talvez seja esse o tal sentido da Vida: sentir.

Mas sentir o quê? O doce e o amargo, também o azedo e o salgado de cada mísero e feliz dia. E se refestelar nos risos e nas lágrimas, como também nos tédios e nas comédias e nas tragédias. A verdade é que se, por algum passe de mágica ou lobotomia, nos fossem retirados nossos júbilos e sofrimentos, perderíamos muito do que somos, ou, quem sabe, perderíamos a nós mesmos. Somos – afinal – nossas histórias mais do que nossas biologias.

Ademais, temos nossos amores, nossos afetos e amados, aqueles que nos ajudam a empurrar a tal pedra.

E os desamores, desafetos e desamados, os que atiram, a nós e a pedra, lá para baixo.

Viver é saber que ambos, mais dia, menos dia, se confundem, se misturam. Ocorre inclusive que seja o ser amado que irá mais te jogar de cima da montanha, e depois a também a rocha.

E o que você vai fazer com isso? Nada de mais, a não ser aprender a lidar com isso.

Afinal, você também magoará aqueles que ama.

Não tem muito sentido. Pois é…

Eu e você sabemos pouco da Vida. Por isso, dessa vez, não farei listas de conhecimentos nem de desconhecimentos. Afinal, um indivíduo pode ser definido por tudo que sabe e não sabe. E pelo que sente ou não sente.  Um ser humano é um conjunto de conhecimentos, experiências, sentimentos e ignorâncias.

Um ser humano é tudo isso. E quase nada.