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Infelizfobia

06 de setembro, 2016 - por Max Franco

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Todo mundo tem egoísmos, e os piores são os inconfessáveis, os escondidos pelas maquiagens das decências postiças.
Pois eu detenho os piores egoísmos. Quase todos de qualidade tão rasteira que os prefiro latentes. Vivos, mas não (tão) atuantes. Egoísmos para serem consumidos homeopaticamente, com moderação.
Tenho, por fortuna, um ou outro, contudo, de pedigree altivo. Egoísmos dos bons. Um deles é o de ver gente feliz. Ver, apenas, não. Qualquer um é capaz de ver. O que me apraz contribuir para que gente seja feliz. É ter alguma culpa naquele incidente chamado felicidade.
Lembrando que felicidade não é um destino alcançado. Isso se chama satisfação.
A questão é que povo infeliz me mata de medo e de angústia. Infelicidade é troço contagioso. Pior que contagioso, é pegajoso. Mal a gente se aproxima de gente atormentada e aquele desamor transborda do amargurado e cola, qual coisa viscosa, nas roupas, na pele, na alma.
Eu fujo de gente infeliz. Mal vejo dobrando a esquina, já passo a rua.
Gente triste merece consolo, carece de ombro, pede afago. Eu, para dizer a verdade, caminho pelo mundo mais triste que alegre. Não donsigo ser infeliz pelos patrimônios que tenho na estante da minha vida. Numa prateleira, memórias inoxidáveis, na outra, pessoas incomparáveis. Como ser infeliz assim?  Mas como ser feliz se o mundo é traiçoeiro e cruel? Só dá para ser feliz aliendando-se. Dá, no máximo, para ser tristemente feliz, ou alegremente deprimido.

Afinal, o infeliz de carteirinha, o infeliz azedo-essencial, só fica menos infeliz  quando a infelicidade é alheia. Ou mais que alheia, coletiva.
Gente infeliz distribui panfletos de rancor na esquina.
Gente infeliz canta suas mazelas, apregoa sua desesperança, sorri do seu dessorriso.
Os felizes, não. Felizes não atormentam, não disseminam, não amargam a sua torta de chocolate com cobertura de leite ninho.
Felizes não roubam, não torturam, não matam.
Felizes torcem a favor.
Cantam desafinado, mas cantam.
Infeliz não canta, geme.
Feliz não cobiça, não inveja, não resmunga, não calunia.
Feliz ama no plural.
Infeliz é sozinho.
Feliz dança na calçada.
Infeliz pula do prédio.
Feliz chora suas dores.
Infeliz as planta, aduba, rega e colhe diariamente.
Feliz quer o bem dos outros.
Infeliz quer os bens do outro.
Feliz não é quem chegou ao fim, mas quem aprecia o meio.
Infeliz tem fins sem meios e meios sem fins.
Feliz é quem sabe que é melhor ser feliz apesar do que ser infeliz por causa.
Eu cultivo gente feliz ao meu lado. Esse é o meu maior egoísmo. Porque, felicidade individual é uma quimera e felicidade acompanhada, um sonho.