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A tal formação continuada

23 de fevereiro, 2023 - por Max Franco

– Como fazemos para fazer que as pessoas queiram estudar? – me perguntou o fundador de uma grande empresa que vem se destacando na formação dos seus quadros. 

Depois de matutar um pouco, tive que ser sincero:

-Essa é a pergunta que me faço e tento responder há mais de 30 anos!

Afinal, como afirma o pensador e historiador Yuval Harari, podemos fazer todo um esforço para formar as novas gerações em algumas habilidades as quais, num futuro bem próximo, potencialmente devem ser substituídas por um novo software e por um aplicativo de celular. É por isso que Harari, Freire e Ausubel, além de outros educadores de renome, atestam que a pauta mais necessária para a Educação atual é a flexibilidade, ou a eficaz prática de “aprender a aprender”. Essa capacidade tem sido batizada com o binômio flexibilidade cognitiva. 

Para tal, faz-se necessário uma atuação inovadora e sistemática dos novos gestores de Educação e líderes empresariais. Uma gestão que incentive a gestação de um ecossistema de engajamento e inovação dentro do útero das instituições de ensino e das empresas que são realmente engajadas no propósito de atualizar seus funcionários.

Infelizmente, há obstáculos e não são pequenos quando falamos do desenvolvimento deste ambiente renovado e criativo dentro de qualquer Casa de Educação, seja no Brasil, seja em qualquer país, seja uma escola de bairro, seja uma grande empresa que deseja formar seus colaboradores. 

Pouca coisa pode ser tão melancólica do que a atitude de um educador ou profissional que se considera completo, absoluto, sem nada mais a aprender. Somos profissionais do Conhecimento. E Conhecimento é feito de uma matéria de natureza infinita. Há sempre, portanto, tanto a se aprender. Precisamos – todos os dias – nos reapaixonar pelo ato de aprender sob o risco de perder o apreço pelo ato de ensinar. 

Ensinar e aprender, afinal, é coisa humana há centenas de milhares de anos. A humanidade só evoluiu porque foi capaz de aprender com outros da sua espécie. Ensinar e aprender, então, sempre foi uma ação capaz de mudar o mundo. 

Nesse novo caminho, precisamos encarar essa estrada, nós, ensinantes e aprendentes, todos, com igual disposição. Precisamos aprender a aprender, aprender a ensinar, ensinar a aprender e a ensinar a ensinar. Ensinaremos e aprenderemos de maneira muito menos monolíticas. Os papéis de cada um, professores,  estudantes, famílias e demais profissionais de Educação, serão mais fluidos, dialéticos, colaborativos, curiosos e solidários.

Isso mesmo: solidário. 

Não foi incomum no período de pandemia o ato, repleto de respeito e empatia, de professores menos versados em tecnologia terem recebido ajuda dos próprios alunos. Este é modelo a ser seguido. A maior conquista das gerações atuais no que se refere ao processo de ensino-aprendizagem é que este seja adotado como um projeto coletivo e participativo. 

A partir dessas premissas, gostaria de começar a responder à pergunta-provocação que inicia esse texto. Para isso, precisamos evidenciar que é necessário, mais do que uma ação pontual ou uma campanha, uma postura crônica de apreço à aprendizagem contínua, é o que se convencionou chamar de “formação continuada”. Todo mundo, então, deve se compreender aprendiz. Como diz Gonzaguinha na famosa canção, “um eterno aprendiz”. Dessa forma, o estudante ou profissional que se acha absolutamente pronto não peca apenas por falta de humildade, mas também por ignorância. Afinal há sempre tanto a se aprender sobre tudo. 

– Mas como mostrar ignorância a quem não se acha ignorante? – essa é outra boa pergunta.

– Autoconhecimento deveria ser a melhor resposta. Só não se acha ignorante quem não se conhece muito bem.  Todas as pessoas que desejam evoluir como seres humanos deveriam ser capazes de entender seus pontos fortes e fracos, seus méritos e deméritos, suas qualidades e debilidades. A verdade é que estamos – todos – em frequente construção.

Nesse contexto, o papel da escola ou empresa é possibilitar que o aprendente se reconheça com as próprias ferramentas e vulnerabilidades com o intuito de que esse ser em contrução possa fazer uso coletivo dos respectivos predicados. A verdade é que o desejo de aprender precede a ação de aprender. Faz-se urgente, então, o estabelecimento dessa Cultura de Aprendizagem Contínua.

O próximo passo é o mais fácil: identificar quais são os conhecimentos necessários, criar uma trilha de aprendizagem para aquele indivíduo ou grupo, planejar como esses conhecimentos serão trabalhados, escolher metodologias que facilitem o processo didático, determinar quais tecnologias podem e devem ser utilizadas para mediar esse acesso e, claro, definir os ensinantes. Professor é sempre protagonista de qualquer história que envolva o ato de ensinar e de aprender. A questão é que nesse processo não deveria haver agentes e pacientes nem seres passivos e ativos. Todos deveriam ensinar e aprender. Portanto, todos deveriam ser protagonistas.

Como gosto de repetir:

-Aprender deve se tornar – cada vez mais – mutirão.