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Vamos falar de resiliência

21 de novembro, 2016 - por Max Franco

Resiliência: Eis uma das palavras da moda.
Por sinal, desde 2015, é a palavra, em Língua Portuguesa, mais pesquisada nos dicionários online. De fato, viver neste mundo bizarro não está uma delícia. É coincidência a procura por esta palavra? Duvido.

Para o Priberam, resiliência significa:
1. [Física] Propriedade de um corpo de recuperar a sua forma original após sofrer choque ou deformação.
2. [Figurado] Capacidade de superar, de recuperar de adversidades.

Particularmente, não concordo com o sentido subjetivo da palavra “resiliência”, porque acredito que exista uma lacuna, um descompasso, entre o sentido literal e o metafórico.
Vou tentar provar o meu ponto usando a etimologia da palavra.
Em Latim, ela é RESILIENS, particípio passado de RESILIRE, “ricochetear, pular de volta”, de RE- “para trás”, SALIRE – “saltar”.(http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/resiliencia)
Em outras, palavras, ser resiliente seria ter a capacidade de voltar à condição anterior ao evento que lhe impôs tensão.
É isso que questiono: não vejo este fenômeno como estritamente positivo. Não observo como vantagem pessoal assimilar a pancada e retornar ao estado precedente. A adversidade tem que ser capaz de lhe modificar. Por isso, acho que a palavra a ser empregada com maior valor agregado é “resistência” e não “resiliência”.
Na minha vida, ainda mais ultimamente, a palavra resiliência me chega, aos ouvidos ou à mente, todos os dias. “Seja resiliente” é uma espécie de mantra, de recomendação band-aid, sempre a tiracolo para ser usada nos momentos dos sinistros.
No entanto, confesso, não quero ser resiliente. Quero ser resistente.Não desejo nem conseguiria voltar à condição anterior. Não há risco de se manter incólume depois de tantas marretadas aplicadas pela vida. Nem vejo como vantajoso “ricochetear” e retornar da mesma forma. O melhor é mudar!
Quando você é resistente, apesar das marcas e das cicatrizes, você ainda está ali, de pé, mantendo a sua posição. Isso machuca, deforma, transforma. Não vejo uma proposta de transformação na resiliência, mas de continuísmo.
Pessoalmente, já levei (e ainda levo) muita porrada neste ringue chamado vida. Muitas – as mais dolorosas – que eu causei. Outras, me foram patrocinadas pelo sujeito Acaso e, também, pelos sujeitos determinados. Afinal, você sempre apanha da própria mão e da alheia. Há sorteios e boicotes, mais contra do que a favor.
Eu sei que cometi acertos e acertei enganos no meu curriculum vitae. E não há causas sem consequências. Sempre vai vir uma conta de se estar vivo. A vida, muita vez, só lhe oferece um prazo, mas a nota promissória sempre chega.
Quando a dor chegar, meu amigo. Não vai adiantar convidá-la para um chopp. Não vai adiantar maquiá-la. O sofrimento tem a própria cara e não é bonita de se ver. A dor é o que machuca, muitas vezes, com a insistência de um telemarketing, sempre exigindo a sua atenção.
A gente tem que aprender a lidar com a mágoa que macula, que inocula medo e angústia, pagar as horas de sono, superar a vontade quase irresistível de desistir, e aprender com ela. Porque a vitória ensina muito menos do que o fracasso. Porque o melhor mestre é a cara ensaguentada na lona.
Do que serviria tanta agonia nessa vida para retornarmos ao mesmo ponto, sem aprendizado e crescimento?
Por isso, resistência é a palavra, e não resiliência. Porque voltar ao estado precedente é pouco, quase nada.
Toda metamorfose pede lágrima e superação. E a única vantagem do sofrimento não pode ser extraviada, a renovação.