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Raposas corporativas

16 de agosto, 2017 - por Max Franco

Era a minha primeira reunião naquela empresa.
Na verdade, “Na” Empresa. Aquela onde todos queriam trabalhar. Entre as melhores do país na satisfação de funcionários. Sinônimo de “futuro promissor”.
Era o meu primeiro dia de trabalho depois de seis fases de seleção. Se alguém falasse a palavra “ansiedade”, eu acho que diria “presente”.
Tive medo do meu nervosismo piscar em neon no meu rosto quando entrei no auditório. Sentei-me na última cadeira e percebi que as minhas mãos suavam gelado. Eu nunca tinha visto as minhas mãos suarem tanto. Tentei me acalmar para não dar bandeira, ainda mais no primeiro dia. Respira, João! Respira!
– Bom dia a todos! É um prazer enorme receber os nossos novos colaboradores. – disse a moça ao microfone. – Mesmo nesta crise absurda pela qual passa o nosso país, nós estamos na contramão, seja em contratações, seja em crescimento. Esta não é uma tarefa fácil! Mas, é marca nossa nadar contra a corrente já faz muito tempo. E, como sabemos, é a melhor forma de endurecer os músculos. Para dar boas-vindas a vocês, quero convidar o presidente e fundador, Pedro Aires, o qual, como vocês bem sabem, dispensa apresentações.
– Olá, pessoal! Obrigado, Ana! Sejam bem-vindos! – disse o homem que já era um mito antes mesmo de morrer. Mito não, lenda! Pedro Aires cairia bem como o “modelo de todo jovem”. Um sujeito que não tinha 40 anos, alto, atlético, bronzeado, competidor de ironman, carismático e, sem dúvidas, um dos empresários de maior sucesso do país. Muitos conheciam a sua história. Tinha sido um executivo de uma das maiores multinacionais. Expatriado, com cargo de diretor. Largou tudo para abrir uma startup de tecnologia. Hoje, dez anos depois, era referência internacional. – Nós vamos ter muito o que conversar neste tempo que estaremos juntos, meus caros. Esta empresa investe muito na formação dos seus colaboradores. Temos uma média de 160 horas por ano de estudos e treinamento. E eu faço questão de conduzir muitos deles.
Dá para perceber quando um sujeito gosta de fazer uma coisa e, sem dúvidas, Pedro amava o palco. Era um urso polar no Ártico. Pedro parecia estar no seu habitat.
– Eu tenho, para começar, um conselho para você que está dando início à sua jornada corporativa. Talvez não seja um pensamento animador, mas quero que vocês o tenham em mente. Você trabalhará com pessoas e para pessoas. E pessoas são movidas por interesses. Nada é de graça! Nem amizades deixam de ser movidas por interesse. No mínimo, este amigo lhe proporciona bons momentos, risos, companhia… A empresa não é lugar para fazer amigos. Empresa é lugar de se trabalhar muito e de se trabalhar em equipe. Não somos sua família. Não somos seus amigos. Somos seus parceiros num projeto. Num grande projeto. Você não precisa amar ninguém, nem ser amado. Precisa apenas saber trabalhar com respeito, empatia e esforço.
“Uau!”, foi o que pensei e quase disse. O cara não podia ser acusado de não ser direto!
– Não estou dizendo que você não fará amigos aqui. Pode até fazer! Mas, não ache que esta será a sua pauta. Por isso, tenha cuidado com adulações. Quem adula, sempre quer algo. Há sempre interesses. Há uma fábula de Esopo que conta o seguinte: um corvo pousou em uma árvore, com um bom pedaço de queijo no bico. Foi que, atraída pelo pelo cheiro do queijo, se aproximou da árvore uma raposa. Raposas, como vocês sabem, são sempre furtivas. É lógico que ela queria comer aquele queijo, mas a raposa não tinha condições de subir naquela grande árvore. Ela, então, decidiu usar sua argúcia em benefício próprio.
– Bom dia, amigo Corvo! – disse a raposa com voz de veludo. E o corvo a olhou fazendo apenas uma saudação com a cabeça.
– Andam dizendo por aí que o rouxinol tem o canto mais belo de toda a floresta. Mas eu aposto que você, meu amigo, caso cantasse, o faria melhor que qualquer outro pássaro. O seu canto é famoso! Por que não canta, amigo e prova o seu valor? – Sentindo-se desafiado, o corvo abriu o bico para cantar. Foi quando o queijo lhe caiu da boca e foi direto ao chão. A raposa apanhou o queijo e agradeceu ao corvo:
– Da próxima vez amigo, desconfie das bajulações!

O silêncio reinava poderoso na sala quando Pedro terminou a sua história.
– Vocês entenderam, meus caros? Cada um de vocês tem seu próprio queijo. Não se preocupem, outros o querem também. Só o que não falta no mundo é raposa. Não se deixem iludir. Palavras seduzem, mas são os atos que  comprovam quem é quem. Neste seu primeiro dia de trabalho, esta é a sua primeira lição: todo mundo tem interesses. Muitos estão dispostos a usar de vários expedientes para conseguirem o que desejam. Protejam o seu queijo!