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A bravura do medo

05 de outubro, 2017 - por Max Franco

Tudo tem a ver com o medo.
É que depois que saímos do logradouro mais confortável e tranquilo no qual já estivemos, o qual foi a barriga da nossa mãe, tudo virou uma potencial ameaça. O fato é que, do ventre ao túmulo, tudo é arriscado e perigoso.
Viver, portanto, é sempre correr riscos.
Por isso, sempre estranho quem tenha medo da morte, quando todos sabemos que a morte não precipita inseguranças. Viver é que atemoriza.
A verdade é que vivemos com medo.
– No início, da falta do leite constante, de perder os dentes, depois do escuro, dos monstros embaixo da cama, do valentão da escola, das provas de matemática, do sexo oposto, de náo ser querido, do chefe, dos impostos, das doenças, até sentir novamente o antigo medo de perder os dentes.
O medo é um companheiro de toda a vida. Talvez, o mais constante. E, pensando bem, muitas vezes, um bom conselheiro. Quantas tolices, afinal, não deixamos de aprontar apenas pelas suas recomendações?
No entanto, daria para declarar se ele é mais benéfico do que negativo?
Quanta coragem nociva o medo também já não nos soprou aos ouvidos?!
Nem sempre o medo é pedagógico. Há uma boa dose de medo na maioria dos vícios humanos.
De onde vem roubo e a corrupção senão do medo de (alguma) privação?
De onde vem os preconceitos senão do medo do diferente?
De onde vem a intolerância senão do medo do que não conheço?
De onde vem o suicídio senão do medo da dor?
De onde vem a solidão senão do medo de se entregar e confiar?
De onde vem a ansiedade senão do medo do amanhã?
Aceita que dói menos. O fato é que somos covardes de nascença.
E, à medida que envelhecemos, perdemos uns, ganhamos outros. Só trocamos de medos. Temos menos? Duvido.
Velhos têm medo até do tapete da sala.
Saber pouco é, muita vez, dádiva. Eu, quando novo, tinha medo de pouco. Hoje, tenho medo até de mim.
O que fazer para conseguir viver num mundo onde a única segurança é o da eterna insegurança?
Talvez, a única saída seja encontrar coragem no medo e medo na coragem.
E, principalmente, saber quando fazer uso mais de um do que do outro.
Como sabemos, às vezes, é preciso ser muito valente para se admitir covarde.
Noutras, mesmo com vertigens de tanto medo, não nos caberá outra coisa além de uma coragem heroica.
No fim, o único equívoco é o da covardia perante a vida.
A vida odeia desertores.